God of War chegou ao PlayStation 4 em abril de 2018 com a proposta de ser um dos capítulos mais emotivos e “pessoais” da vida de Kratos, protagonista da franquia desenvolvida pelo Santa Monica Studios desde 2005. De Deus da Guerra que peita deuses e criaturas da mitologia grega, o personagem envelheceu e partiu em busca de descanso e paz em terras nórdicas, dando início a um novo capítulo de sua jornada. Tal capítulo pegou muitos fãs de surpresa, já que o bruto Kratos, além de transitar para outra mitologia, também se tornou pai. Uma das séries de maior sucesso do gênero hack and slash nas plataformas da Sony mudou de tom, e isso funcionou.
A ação cinematográfica rendeu novidades, também, nas mecânicas de jogo: enquanto jogadores controlam Kratos para enfrentar ondas de inimigos, Atreus surge como um aliado que pode desferir ataques, atordoar inimigos e até jogar pedras de cura para o pai. Além disso, o game deixa as Lâminas do Caos de lado e implementa uma nova arma principal: o machado Leviatã, que, quando lançado em direção a inimigos ou objetos, volta às mãos do personagem ao melhor estilo Thor, do Universo Marvel. A ação está lá, os puzzles estão lá, a dinâmica pai e filho também, mas há um pequeno detalhe que mudou toda a minha perspectiva e opinião sobre o game.
Não me aprofundo na história de God of War, mas é preciso saber seu ponto inicial para entender o peso de tal detalhe: após a morte de Faye, mulher de Kratos e mãe de Atreus, pai e filho viajam rumo ao pico mais alto dos nove reinos nórdicos para espalhar suas cinzas ao vento. E é na exploração dos mundos abertos do game que o detalhe se esconde.
Logo no começo do game, Kratos encara uma árvore marcada pela palma da mão dourada de Faye, sua finada esposa. Ele derruba a árvore e dá início à sua nova jornada. A marcação dourada pode parecer só um marco de conexão entre o casal, mas ao longo da exploração de Midgard e outros reinos nórdicos, é possível ver que o detalhe não é nada acidental ou insignificante. A palma da mão de Faye marca não só o início do jogo, não só o início da jornada de Kratos, mas, principalmente, o ponto de partida da nova aventura do protagonista. E chamo de “marcação” e “ponto de partida” porque a palma da mão dourada é uma sinalização de Faye à Kratos. A sua palma da mão é o começo de um guia, de uma rota que ele e o filho devem seguir. Aliás, não só Kratos e Atreus, mas os jogadores também.
Ao longo do game, jogadores passam por diferentes ambientes e terrenos nos mapas nórdicos. É possível escalar paredões de pedra, pular ou caminhar pela beirada de precipícios e muito mais. E é aí que entra o detalhe que eu quero te mostrar: todos os terrenos interativos, ou seja, aqueles que permitem que o jogador faça alguma ação, são marcados por runas douradas. Ao ver as marcações douradas, os jogadores se aproximam e entendem que tal parede pode ser escalada. As marcações também indicam quais caminhos Kratos e Atreus podem seguir. Um exemplo é o vão formado por duas rochas gigantescas. Com a marcação, os jogadores entendem que é possível se espreitar por pequenos buracos, fazendo com que pai e filho sigam sua jornada. Jornada essa que é guiada pelo ouro. Abaixo, ilustro a marcação em ouro em uma parede escalável.
Essas marcações e cores compõem um dos muitos recursos do game design para indicar e guiar os jogadores, já que ao ver símbolos e cores diferentes, conseguimos diferenciar os terrenos dos mapas e rapidamente aprender que é possível interagir com eles. À título de comparação, Mirror’s Edge, lançado em 2008, guia os jogadores através de objetos vermelhos e amarelos na tela. Assim, fica mais fácil identificar quais caminhos devemos seguir sem muitas confusões. Mas God of War faz isso diferente – e foi essa diferença que me fez gostar ainda mais do game.
Ainda em 2018, o diretor do jogo, Cory Barlog, revelou que as marcações foram feitas por Faye para guiar Kratos e Atreus. Se a palma da mão marca o início da jornada dos personagens, as runas douradas em diferentes terrenos interativos mostram qual caminho pai e filho devem seguir para cumprir o principal objetivo do jogo. As marcações douradas podem parecer um simples recurso, mas adicionar uma explicação à elas me deixou ainda mais admirado. As marcas não estão lá só para cumprir uma função mecânica e semiótica, elas estão lá como parte essencial da história. Sem elas, Kratos e Atreus (e jogadores) caminhariam por Midgard sem rumo. No fim das contas, Faye guia pai, filho e jogador, sem que ninguém perceba até que eles finalizem a jornada do game.
Lançado em 2018, God of War foi reconhecido como o Melhor Jogo do Ano durante o The Game Awards e está disponível para PlayStation 4 e, recentemente, recebeu uma atualização para o PlayStation 5.