Recentemente, Grand Theft Auto V foi considerado o produto de entretenimento mais rentável da história. Lançado originalmente em 2013 para Playstation 3 e Xbox 360, ganhou versões remasterizadas para PS4, Xbox One e PC logo depois. Ao alcançar a marca de noventa milhões de cópias vendidas, ficando atrás apenas de Tetris (170 milhões) e Minecraft (120 milhões), levou os vídeo games ao topo da cadeia “alimentar” do entretenimento geral (incluindo o cinema, livros e músicas)colocando mais de seis bilhões de dólares nos cofres da Rockstar.
Mas o que será que faz Grand Theft Auto V chegar nesses números jamais alcançado por outro jogo? (Nota do redator: apesar de Tetris e Minecraft terem vendido mais cópias, a arrecadação de GTA V é superior aos dois jogos)
GTA V e sua nova fórmula de sucesso
Grand Theft Auto V trouxe diversas inovações à série e a principal é a forma com que avançamos na história. Diferente das versões anteriores, onde controlávamos apenas um único personagem, desta vez a história é dividida entre três principais personagens: Franklin, Michael e Trevor. Além de mudanças na jogabilidade (escolhemos qual personagem queremos controlar a qualquer momento do jogo) e um trabalho gráfico nunca antes visto na série, GTA V também trouxe um modo de jogo que se tornaria o arrasa quarteirão da série: o Grand Theft Auto Online.
Este modo online é o grande trunfo da Rockstar para o jogo continuar lucrando uma tonelada de dinheiro, mesmo após tantos anos de seu lançamento. Mas modo online já não é novidade nos vídeo games desde a época do Dreamcast e nem mesmo outros jogos que fizeram grande sucesso chegaram sequer perto do que GTA Online tem feito. Então por que o jogo da Rockstar fatura tanto?
Uma máquina de fazer dinheiro
A série Grand Theft Auto sempre fez sucesso desde o lançamento do primeiro jogo, lá em 1997. Com boa recepção tanto da imprensa especializada, quanto dos jogadores, Grand Theft Auto vendeu pouco mais de um milhão de cópias em todo o mundo. Um número bem expressivo para a época, ainda mais se considerarmos que o jogo era de uma produtora pequena e relativamente desconhecida: a DMA Design Limited. Até então, a série Lemmings era seu jogo mais conhecido, tendo versões lançadas para praticamente todos os consoles disponíveis da época. Em 1999, e já com o novo nome Rockstar Games, a DMA lançou o segundo jogo da série, Grand Theft Auto 2, que também foi bem recebido.
Outros jogos da série foram lançados ainda no universo 2D com visão aérea, mas GTA só ganhou a notoriedade que merecia com a chegada dos consoles de 128 bits, e mais precisamente falando, da chegada do Playstation 2. E não foi por acaso, diga-se. Junto com o PS2, veio a evolução do mercado de games e porque não dizer, o amadurecimento definitivo dos jogos de vídeo games. A revolução que a geração 128 bits trouxe não ficou restrita apenas ao serviço on line ou o surgimento de mais franquias com uma classificação indicativa para adultos. A maneira como passamos a tratar os jogos ficou muito mais séria, trazendo-os definitivamente para o mesmo nível do cinema, música e afins. E as empresas passaram a ter lucros (e despesas) muito mais significativos para bater de frente com as outras mídias.
A chegada de uma nova era
Grand Theft Auto III trouxe a mais significativa mudança na forma que jogávamos dos últimos anos: a jogabilidade do mundo aberto. Mas ao contrário do que muitos jogadores pensam, a fórmula “mundo aberto” não foi uma criação da Rockstar. Vários jogos lançados na década de oitenta faziam uso desta fórmula, ainda que de uma forma não tão livre quanto GTA III permitia. E, obviamente, não podemos deixar de mencionar o grande título do Dreamcast: Shenmue.
Shenmue foi lançado em 1999 pela Sega e trouxe grandes inovações. Uma dessas inovações foi chamada de FREE, ou Full Reactive Eyes Entertainment, o precursor da jogabilidade de mundo aberto que conhecemos hoje. Mas se foi Shenmue que nos apresentou a jogabilidade de mundo aberto da forma que conhecemos hoje, por que creditamos isso à série GTA?
Porque GTA não só trouxe grandes melhorias, como foi o principal jogo do gênero a dar real liberdade ao jogador. Por mais que em Shenmue o jogador pudesse andar livremente pelos cenários, interagindo com NPC’s, visitando academias e casas de fliperamas, havia limitações impostas que não deixavam o jogo tão livre assim, principalmente em questões de horários. Já em GTA III, isso não havia e o jogador era realmente livre para fazer o que quisesse, inclusive abandonar as missões para ficar causando o terror pela cidade. E isso foi evoluindo a cada novo jogo da série. Além é claro, de trazer histórias mais ricas e muita, muito polêmica.
Violência em jogos sempre existiu. Mortal Kombat está ai como prova. Jogos como Resident Evil e Metal Gear Solid, por exemplo, uniam temas mais pesados com muito sangue espirrando pela tela, mas sem levantar maiores controvérsias. Com a série GTA, a Rockstar chutou o balde de vez ao dar liberdade para o jogador matar quem, e o que, ele quisesse. E da forma que ele achasse mais divertido. E foi ai que ela conquistou o público. Mas a série GTA vai além de matar velhinhas atropeladas e roubar carros e bancos.
Revolução controversa e lucrativa
História forte e pesada, tiros, drogas, perseguições policiais, assassinatos, roubos, mapa gigante para ser explorado, trilha sonora diversificada e liberdade para fazer o que quiser, quando quiser e se quiser. Foram lançados três jogos (Nota do redator: foram lançados também outros dois jogos da série para o PS2, ports dos jogos lançados para o PSP) para o Playstation 2: GTA III, GTA Vice City e GTA San Andreas. Três jogos que influenciaram a indústria de uma forma jamais vista. Após o lançamento de GTA III, vários jogos de diversos gêneros foram redesenhados para seguirem este novo caminho. Era possível dirigir e pilotar diversos veículos, inclusive veículos aéreos e náuticos; também era possível fazer apostas em corridas de cavalos e disputar corridas de carros, de moto ou mesmo de bicicleta. Praticar alguns esportes também era permitido. Está a fim de dançar? Ótimo. Era só seguir até uma danceteria e mexer o esqueleto. Que tal ir até uma academia e fazer alguns exercícios físicos? As possibilidades eram imensas. Mas ainda faltava algo: o modo cooperativo.
A série só recebeu um modo cooperativo com o lançamento de GTA IV. Até então, a único possibilidade de jogar com um amigo era em San Andreas, mas era um modo muito restrito, acessado apenas em alguns pontos do mapa, e que não permitia jogar a campanha principal. Com a chegada da série na geração PS3/Xbox 360, a Rockstar incluiu um modo cooperativo online, mas ainda sem a possibilidade de fazer as missões principais. Mas agora era possível se juntar a outros 15 jogadores e disputar diversos modos de jogo, incluindo corridas e o tradicional mata a mata. O modo online de GTA IV foi a porta de partida para o monstro que seria lançado a seguir.
GTA Online, a Rockstar rindo à toa
Grand Theft Auto V chegou em 17 de Setembro de 2013 e em apenas três dias, estourou a casa do um bilhão de dólares em vendas, destruindo qualquer recorde anterior de qualquer jogo já lançado. Grandioso, o modo offline é considerado o melhor da série até o momento, trazendo melhorias em todos os sentidos imagináveis. Durante o desenvolvimento de GTA V, a Rockstar desenvolvia paralelamente o GTA Online, e o transformou em praticamente num outro jogo.
Após cinco anos do seu lançamento e noventa milhões de cópias do jogo principal vendidas, a maior parte da renda vem das micro-transações dentro do jogo online. Este modo é tudo o que o jogo Second Live tentou ser: um gigantesco mundo aberto à comunidade, permitindo a criação de personagens, grupos dos mais diversos tipos, disputas de campeonatos, planos de roubos a banco, ataques a outros grupos, etc. É praticamente uma comunidade virtual com direito a tudo o que você puder imaginar.
Diferente de outros jogos, em Grand Theft Auto Online você não é obrigado a participar das disputas online. Se você tiver a intenção de só passear pela cidade e encontrar com outras pessoas, sem o intuito de vencê-las numa disputa de roubar a bandeira ou mata a mata, você pode. Além disso, vários pacotes de modo de jogo são lançados regularmente, renovando o estoque de carros, armas, desafios e etc. O que faz estes modos de jogo serem absurdamente bem recebidos é o conteúdo que o acompanham. Por exemplo, recentemente a Rockstar lançou o pacote “Southern San Andreas Super Sport Series” contendo o novo modo de corridas “Hotring Circuit”. Ano passado foi disponibilizado o modo “Motor Wars”, um modo competitivo de sobrevivência muito parecido com o jogo “PlayerUnknown’s Battlegrounds”. Entre tantos outros que já foram lançados e tantos outros que estão a caminho. E tudo gratuito.
Mas se é tudo gratuito, como pôde alcançar seis bilhões de dólares de lucro? Simples. Tudo o que você quiser comprar dentro do jogo, você vai precisar de dinheiro. Para conseguir esse dinheiro, você vai precisar trabalhar duro, seja roubando e vendendo carros, com tráfico de drogas, assaltando bancos, vencendo corridas ou qualquer meio criativo que você inventar no jogo online. Quanto mais reputação você tiver, mais dinheiro você vai ganhar. A moeda do jogo chama-se GTA$ e você pode consegui-la sem gastar um único real, mas vai ter que ralar muito para conseguir grandes quantias. E é ai que entra as micro-transações: há a opção de comprar GTA$ na loja do jogo.
Em Novembro de 2017, a Take-Two, empresa dona da marca Rockstar, declarou que quase 50% do seu lucro veio de micro-transações de seus jogos, principalmente de GTA Online.
Checkpoint sem volta
A durabilidade de GTA Online mostra que cada vez mais o online é um caminho sem volta; caminho que muitas empresas estão tomando como seu principal. Sim, ainda teremos jogos da série GTA com histórias singleplayer, mas com menos frequência do que é hoje. Faz cinco anos do lançamento do último Grand Theft Auto, e pelos boatos, o próximo não sai antes de 2022, ou seja, nove anos depois.
GTA V não só é um grandioso projeto do entretenimento, como está fazendo a Rockstar ditar, mais uma vez, os rumos da indústria dos games. Pois mostra que não é só lançar jogos lotados de loot box e micro-transações para ter lucro.