Na era de remakes e remasters elaborados, chega uma data especial: os 35 da franquia Super Mario. Para comemorarmos, Super Mario 3D All-Stars: Super Mario 64, Super Mario Sunshine e Super Mario Galaxy. Tudo isso em um cartucho só, com algumas melhorias visuais e adaptações para o gameplay ser funcional no Nintendo Switch. Fora isso? Exatamente a mesma experiência vista no Nintendo 64, GameCube e Wii.
E… isso lá é ruim?
Durante toda a história da Nintendo no mercado de games, essa é apenas a terceira vez que vejo (e me recordo) de uma coletânea. Fora esta, tivemos Metroid Prime Trilogy (Wii) e Super Mario All-Stars (SNES), esse último tendo mudanças significativas, já que o ambicioso projeto migrou os jogos da era 8-bits para a de 16-bits.
Ser igual ao que lembramos é necessariamente ruim? Um projeto mais ambicioso poderia melhorar ou piorar sua experiência com esses jogos? É sobre isso e mais que falaremos na análise de hoje.
A análise só foi possível graças à chave fornecida a nós pela Nintendo Brasil. Obrigado, Nintendo! E vamos ao que interessa:
Visão Geral
O ano de 2020 foi um ano difícil para a Nintendo guardar segredos, já que essa coletânea era discutida como rumor há um certo tempo. O dia 3 de setembro traz o anúncio oficial, mas o espaço para teorizar e sonhar já tinha sido utilizado, o que fez algumas pessoas não se sentirem tão satisfeitas com o esforço da Nintendo com essa coletânea.
Vale ressaltar que a própria Nintendo optou por manter os jogos os mais fieis às suas raízes originais, melhorando texturas e proporção de tela. Então, diferente do que foi Super Mario 64 (2006) para o Nintendo DS, os jogos e as experiências aqui se mantém intactos. O que será analisado especificamente é como essas experiências ficaram adaptadas a realidade do Nintendo Switch.
A ideia é falar separadamente de cada jogo, ressaltando gráficos, gameplay e experiência como um todo. Ao final, somar tudo isso em um veredito voltado para a coletânea. Vamos? Let’s-a-go!
Super Mario 64
Começando pelo elefante na sala e pelo irmão mais velho dentre os três. Chega a ser irônico como o jogo que estabeleceu regras importantes para os outros dois (e para a jogabilidade 3D no geral) seja a “ovelha negra” da coletânea. O que mais se manteve em seus moldes originais, Super Mario 64 foi lançado originalmente em 1996 e é o único a não ocupar a tela toda, mantendo seu aspecto original de 4:3 (com bordas pretas nos cantos e imperceptíveis bordas nas partes superior e inferior).
Usando o castelo da Princesa Peach como uma desculpa para ser uma central de fases (ou um hub, para ser mais chique), Super Mario 64 traz a criativa ideia de acessar os mais diversos mundos através de molduras que ficam nos cômodos do castelo. No caminho, resgatando 120 estrelas e a princesa das garras de Bowser.
Apesar de lançado em 96, a coletânea marca o jogo como 1997, já que estamos falando da versão chamada “Shindou Edition”, com melhorias aplicadas na versão original, que inclui suporte para vibração e algumas mudanças menores na jogabilidade. Você não ouvirá mais o “So Long, King Bowser” e os speedrunners não poderão mais usar um truque de velocidade acumulada para bater seus recordes. Nada muda para o jogador final.
Falando sobre o que a coletânea mudou no jogo, basicamente as texturas estão mais “limpas” e houveram mudanças nos diálogos, para que os controles do Switch sejam mencionados ao invés dos de Nintendo 64.
Gráficos
Eu não quero passar pano aqui. É claro que daria para um trabalho melhor ter sido feito pela Nintendo. Quem nunca viu aqueles vídeos conceito de Super Mario 64 rodando na Unreal Engine em 4K onde até o bigode se move com o vento? Mas poder ter feito um trabalho melhor não significa que o que está feito é ruim.
O “Mario quadradão” é uma assinatura do Nintendo 64, do que temos nas lembranças, do que faz o jogo ser o que foi. Mudar isso para um Mario atual poderia mais irritar do que agradar. Voltando a falar dos remakes que a internet fez de Mario 64, nenhum deles tinha essa sensação de “ser o Mario 64”, inclusive não senti isso nem com a versão de DS. Talvez seja algo que só ele seja e só ele será.
Jogabilidade
Manter tudo como era tem suas vantagens: para quem já jogou, é como visitar uma casa que não visita há anos. Você sabe onde está tudo, com quem falar, aonde precisa ir, o que precisa ser feito. Essa sensação de estar em casa é leve, é boa. O Joy-Con e o Pro Controller fazem um ótimo trabalho para adaptar o que foi pensado para o controle de três pernas do 64. A câmera não é livre, ela trabalha com 5 ângulos diferentes, mas nada que seja difícil de entender e se acostumar.
O jogo é tão intuitivo que é possível pular todos os diálogos que ele possui e ainda assim será possível entender o que fazer e como precisa ser feito. A experiência ser a exata vista 24 anos atrás continuar tão leve e tão fluida nos dias de hoje só dá ainda mais força para esse jogo, que foi um marco para a indústria em questão de fama própria e influência.
Os gráficos datados, se forem vistos na ótica de preservação, chegam a ficar inclusive charmosos, como se você tivesse a oportunidade de jogar direto do cartucho, sem precisar assoprar dessa vez.
Super Mario Sunshine
Aqui está o jogo que mais precisava ser revisitado. O único preso em seu console e controle original até então e na minha opinião, o verdadeiro injustiçado, Super Mario Sunsinhe é para mim um dos melhores jogos 3D do Mario. Ele é divertido, diferente, tenta novas coisas e aperfeiçoa bons conceitos que o passado criou.
Cheio de piruetas, novos personagens e até mistérios (!), Sunshine brilha como nunca brilhou em 3D All-Stars. Mario e seu novo amigo FLUDD trocam as férias paradisíacas pela responsabilidade de limpar a ilha e seus nomes das bagunças feitas por Shadow Mario.
Gráficos
Mario e a Delfino Island envelheceram bem na questão gráfica. Claro que dá para perceber e entender que o jogo não é atual, mas se você perguntar a quem nunca jogou Sunshine o ano em que ele foi lançado, dificilmente alguém vai chutar 2002.
Os efeitos da água, das sujeiras da ilha e interação com os personagens (você pode pular, jogar água neles, limpá-los…) são impressionantes para um jogo lançado há mais ou menos 18 anos e a vibe mais praiana do jogo aposta em cores vivas e ensolaradas que já eram lindas no GameCube e ficam ainda mais no Switch.
As texturas revisitadas e o fato dos botões do GameCube serem muito semelhantes aos do Switch trazem um ar de que o jogo meio que se encaixaria no híbrido sem grandes esforços, e foi exatamente o que aconteceu.
Jogabilidade
O jogo é dinâmico: talvez o calor e as férias frustradas de Mario tenham feito o personagem estar tão rápido como está nesse jogo. A câmera livre antes era invertida, agora foi adaptada para se comportar como qualquer câmera atual que você já tenha encontrado por aí. O FLUDD é ótimo e traz uma nova vida para as plataformas, mas vez ou outra me pegava pensando sobre ele realmente ser necessário em todos os cenários. Tirando situações que envolviam a limpeza propriamente dita, algumas vezes dava uma vontade de apenas desacoplar ele e sair correndo por aí contando apenas com os pulos e escaladas de Mario.
Até existem momentos em que somos forçados a não usar o FLUDD, mas são em poucas fases com conceitos muito parecidos, o que não matou essa minha vontade. Todos os chefes são bastante divertidos e únicos, cada ilha tem sua própria assinatura e pegar todas as Shines é tão divertido e desafiador quanto as 120 estrelas de Mario 64.
A mudança de controles também foi bem feita. Apesar de ser considerado o melhor controle por muitos, os Joy-Cons e Pro Controller conseguiram herdar as vantagens do controle do GameCube. A única exceção vai para os tiros “menos intensos” com FLUDD. No GameCube, o botão R era analógico, ou seja, você conseguia definir uma pressão para o botão. Uma pequena pressão significava um jato fraco, uma pressão forte era um jato completo. A versão de Switch só trabalha com o jato completo, por conta do botão digital. Não atrapalha em nada a jogatina (sério mesmo), mas perde a sensação de estar controlando com mais precisão.
Nada disso tira o brilho do grande passo que foi Sunshine, que inclusive trouxe cutscenes com dublagens! Uma pena não ter voltado em outros jogos…
Super Mario Galaxy
Chegamos ao ápice. Super Mario Galaxy é considerado por muitos o melhor jogo 3D de todos os tempos e não é para menos. Seguindo a linha de “ser mais que Mario 64”, Galaxy foi lançado originalmente em 2007 e consegue inclusive superar Sunshine, sendo inovador, épico e uma das aventuras mais marcantes de Mario.
Assim como em Super Mario 64, Mario recebe um convite de Peach, mas dessa vez para ver o festival de cometas que ocorre a cada 100 anos. Como era de se esperar, Bowser rouba a cena, levando Peach e o castelo para o espaço, fazendo com que Mario desafie novos obstáculos (e a gravidade!) em busca de sua amada.
Ler “Mario” e “Galaxy” no mesmo título ainda é muito estranho para mim. A ideia de mandar Mario ao espaço é surreal por si só, já que sempre falamos de Mushroom Kingdom e no máximo outras localidades que sempre parecem estar próximas, vide Delfino Island, que foram de avião. Galaxy leva tudo ao próximo nível, incluindo o jogador e a jogabilidade, e assim como o espaço, é vastamente idolatrado e com muito para explorar.
Gráficos
O que já era lindo no Wii está maravilhoso no Switch. Sério, se você jogou ambas as versões e não sentiu tanta diferença, procure umas comparações na internet. Galaxy foi talvez o que mais se aproveitou do upscaling gráfico, já que era nítido que o jogo queria mostrar tanto em um console que talvez não tivesse poderio para acompanhar na época original de lançamento.
A proposta espacial e vasta é muito potencializada. Ir dos 480p para 1080p (ou 720p se estiver no portátil) foi um salto da Terra até a Lua para esse jogo, que continua lindo mesmo 13 anos passados.
Jogabilidade
Outro fator impressionante. Eu sempre tive a sensação de que “jogos de Wii morreriam no Wii” (estou olhando para você, Zelda Skyward Sword), isso porque os controles de movimento e o sensor do Wii pareciam insubstituíveis. Mas os Joy-Con e Pro Controller mostraram que eu estava errado! Adaptando o pointer do sensor através do giroscópio e os controles de movimento para os botões presentes nos controles tornou tudo tão fácil e nativo que fica possível enxergar outros jogos de Wii bebendo dessa fonte.
Nem tudo são flores, afinal no modo portátil isso tudo é substituído com o toque, o que faz com que você tenha que soltar um dos controles para interagir com a tela. Fora isso, jogar com o WiiMote e o Nunchuck versus jogar com um Joy-Con em cada mão… Não sei qual será mais marcante em alguns anos.
A Coletânea
São três jogos em três eras diferentes e com ambições diferentes. Não havia nada igual no momento em que os três nasceram e talvez não haja até hoje.
Os menus de seleção são extremamente voltados à sensação de “visitar um museu”, onde existe informações dos jogos, como data de lançamento, descrição, pequenos demonstrativos do game, e também uma parte de trilha sonora de cada um. Não falamos sobre músicas até agora, mas todas são muito marcantes, deixando os aplausos para as músicas de Galaxy, que são orquestradas.
O modo “Music Player” traz um jeito de apreciar essas músicas, incluindo versões nunca vistas nos jogos e um modo com tela desligada, para você usar o Switch como um MP3 Player. O jogador fica preso na ordem em que o jogo determina, sem poder voltar, pausar, ou colocar em modo shuffle para ouvir de maneira aleatória.
Apesar da parte musical agregar para a coletânea, eu senti falta talvez de colecionáveis ou missões desbloqueáveis, um menu de curiosidades, conceitos de fases os personagens ou modelos em 3D expostos como galeria. Quem sabe até algo menos elaborado, como uma Title Screen diferente a depender do jogo em que você está avançando, algum easter egg ou vídeo especial, enfim.
Veredito
Nós como fãs pensamos muito em detalhes e cenários ideais ao falarmos diretamente da nossa memória afetiva com algum jogo, quando na verdade, se pensarmos bem, nos foi entregue exatamente o que queríamos: bons jogos que fizeram história, pensados em ser o mais próximo do que foram no passado, respeitando inclusive nossas memórias, sendo mostrados exatamente na fórmula que os fizeram decolar.
É claro que, ainda falando como fã e para fãs, a gente sempre quer mais, e sempre sente falta de algo. Mas é complicado delimitar o que realmente queremos e o que ficaria legal de ver num produto final. Será que gostaríamos de ver esses jogos “descaracterizados” com um remake, ou será que é algo legal apenas de se assistir no YouTube?
O jogo é ótimo para colecionadores, fãs e também para os que vão explorar algum deles ou todos pela primeira vez. Existe um desapontamento aqui e ali principalmente se pensar no lado comemorativo da coisa, mas não dá para negar que o principal foi feito e os nostálgicos serão capazes de matar a saudade e os “novatos” de entender com mais força ainda a história e responsabilidade que Super Mario 3D World e Odyssey carregam.